Sob uma máscara de terminologia cristã, uma variada gama
de psicoterapias está assolando a Igreja, levando os crentes a afastarem-se de
Deus e a voltarem-se para si mesmos. Dentre elas, as mais nocivas são as
terapias regressivas, criadas para sondar o inconsciente do indivíduo à procura
de lembranças escondidas que supostamente causam males que vão desde a
depressão, os acessos de ira e até as más condutas sexuais, e por isso devem
ser reveladas e "curadas". Estas ramificações de teorias freudianas e
jungianas, baseadas no ocultismo e que há décadas vêm causando um impacto
destrutivo na sociedade, estão agora fazendo estragos dentro da Igreja.
A "cura interior"
Uma forma popular de terapia de regressão é a chamada
"cura interior", introduzida na Igreja pela ocultista Agnes Sanford
(veja A Sedução do Cristianismo). Depois de sua morte, [essa terapia] foi
levada avante pelos que foram influenciados por ela, tais como os terapeutas
leigos Ruth Carter Stapleton (irmã do ex-presidente americano Jimmy Carter – N.
R.), Rosalind Rinker, John e Paula Sandford, William Vaswig, Rita Bennett e
outros. A cura interior, no início predominante entre igrejas carismáticas e
liberais, espalhou-se amplamente nos círculos evangélicos, onde é praticada de
forma mais sofisticada por psicólogos como David Seamonds, H. Norman Wright e
James G. Friesen, e igualmente por terapeutas leigos como Fred e Florence
Littauer. A insistência veemente dos Littauer de que rara é a pessoa "que
pode dizer que verdadeiramente teve uma infância feliz", certamente
condiciona seus aconselhados a recobrar memórias traumáticas e infelizes.
Mesmo que fosse possível, com precisão e segurança,
deveríamos sondar o passado para trazer à tona memórias esquecidas?
Notoriamente, a memória é enganosa e está a serviço do ego. É fácil persuadir
alguém a "lembrar-se" de algo que jamais pode ter ocorrido. Pela sua
própria natureza, tal como outras formas de psicoterapias, a cura interior cria
falsas memórias. Além disso, por que deverá alguém revelar a lembrança de um
abuso passado para que possa ter um bom relacionamento com Deus? Onde se
encontra isto na Bíblia? Se parcelas do passado devem ser
"lembradas", por que não cada detalhe? Essa tarefa se mostraria
impossível. Entretanto, uma vez aceita esta teoria, jamais se terá certeza de
que algum trauma não continue escondido no inconsciente – um trauma que detém a
chave do bem-estar emocional e espiritual!
"...as coisas antigas já passaram..."
Contrastando com esta idéia, Paulo esquecia-se do
passado e prosseguia para o prêmio prometido (Fp 3.13-14) a todos quantos amam
a vinda de Cristo (2 Tm 4.7-8). As conseqüências do passado são insignificantes
se os cristãos são verdadeiramente novas criaturas, para quem "as
coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas" (2 Co 5.17). Investigar
o passado de alguém a fim de achar uma "explicação" para o seu
comportamento atual choca-se com o ensino completo das Escrituras. Se bem que
possa parecer uma ajuda por algum tempo, na realidade, está tirando da pessoa a
solução bíblica através de Cristo. O que importa não é o passado, e sim o nosso
relacionamento pessoal com Cristo agora.
Mesmo assim, muitas pessoas afirmam ter sido ajudadas pela
terapia regressiva. Descobrir a "causa" em um trauma passado (seja
real ou uma "memória" implantada por sugestão no processo
terapêutico) pode produzir uma mudança de atitude e de comportamento por algum
tempo. No entanto, mais cedo ou mais tarde, voltará a depressão ou a ira, a
frustração ou a tentação, levando a pessoa a renovar a busca no passado para
descobrir o trauma "chave" cuja lembrança ainda não foi revelada. E
assim continuamente.
"Hiatos de memória"?
Em harmonia com o princípio freudiano de toda "cura
interior", o livro Freeing your Mind from Memories that Bend (Libertando
Sua Mente de Memórias que Aprisionam) de Fred e Florence Littauer apresenta a
tese de que revelar as memórias ocultas é a chave para o bem-estar emocional e
espiritual. Eles sugerem que quaisquer "hiatos de memória" da
infância indicam a probabilidade de abuso (com grande possibilidade de ser na
área sexual). Por esta definição, todos nós fomos abusados, pois a maioria de
nós não se consegue lembrar de cada casa em que moramos, de cada escola onde
estudamos, de cada professor e colega de aula, de cada passeio com a família
quando éramos crianças. Ensinar que estes "hiatos de memória" indicam
períodos de abuso encobertos na lembrança, como fazem os Littauer, é contrário
ao senso comum, sem respaldo científico e sem apoio bíblico.
Quatro Temperamentos, Astrologia e Testes da
Personalidade
Os Littauer, como tantos outros autores neste campo,
baseiam sua abordagem nos chamados quatro temperamentos. Essa teoria sobre a
personalidade, já há muito desacreditada, surgiu da antiga crença grega de que
o universo físico era composto de quatro elementos: terra, ar, fogo e água.
Empédocles relacionou-os com quatro divindades pagãs, enquanto Hipócrates
associou-os aos que eram considerados, na época, os quatro humores do corpo:
sangue (sangüíneo), fleuma (fleumático), bílis amarela (colérico) e bílis negra
(melancólico). Estas características eram ligadas aos signos do zodíaco.
Apesar da falta de base científica para os quatro
temperamentos, muitos psicólogos cristãos e "curadores" leigos, no
entanto, confiam neles plenamente e fazem deles a base para "classificação
da personalidade" e a chave para o discernimento comportamental. Contudo,
como salientam Martin e Deidre Bobgan em seu excelente livro Four
Temperaments, Astrology & Personality Testing (Quatro Temperamentos,
Astrologia e Testes da Personalidade):
A palavra temperamento vem do latim temperamentum,
que significava "combinação apropriada". A idéia era que se os
fluidos corporais fossem temperados, isto é, reduzidos em sua intensidade
contrabalançando os humores uns com os outros, então ocorreria a cura...
Pensava-se que até mesmo as posições dos vários planetas
alteravam para melhor ou pior tais fluidos...
Os quatro temperamentos já tinham sido virtualmente
descartados após a Idade Média... até que alguns extravagantes os descobriram
no baú do passado e os colocaram no mercado na linguagem do século XX...
[Recentemente] os temperamentos experimentaram um renascimento... entre astrólogos
e cristãos evangélicos... Os quatro temperamentos são a parte da astrologia
tornada palatável para os cristãos.
Versículos fora do contexto
Tal como outros psicólogos cristãos e praticantes leigos
da cura interior, a teoria e prática dos Littauer não provêm de uma exegese
cuidadosa das Escrituras, mas eles citam, de vez em quando, um versículo
isolado na tentativa de dar aparência de apoio bíblico. Por exemplo, eles citam
parte de um versículo – "Eu, o Senhor, esquadrinho o coração, eu
provo os pensamentos [do homem]" (Jr 17.10) – que aparece logo abaixo
do título do segundo capítulo: "Examinando-nos a nós mesmos". Na
realidade, esse texto bíblico opõe-se à idéia de nos esquadrinharmos a nós
mesmos. Somente Deus pode compreender e esquadrinhar os nossos corações. "Enganoso
é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto, quem o
conhecerá? Eu, o Senhor, esquadrinho o coração... para dar a cada um segundo...
o fruto de suas ações" (Jr 17.9,10).
O contexto destes dois versículos desmente a aplicação
feita não só pelos referidos autores, mas também por outros bem-intencionados
"praticantes da cura interior". Deus amaldiçoa quem confia em
qualquer outra coisa e abençoa aqueles que confiam exclusivamente nEle. Quanto
a estes, segundo a Sua promessa, "serão como árvore plantada junto às
águas, e [nunca] deixarão de dar fruto" (Jr 17.8). Uma vida frutífera
(amor, alegria, paz, etc.) é produzida pela obra do Espírito de Deus na vida
dos que submetem a Ele seus corações enganosos! Em lugar algum a Bíblia diz que
fazer testes de personalidade e conhecer o "temperamento" de alguém
ajuda Sua obra em nós.
Os Littauer têm extrema dificuldade em encontrar textos,
ainda que remotamente apropriados, e por isso são forçados ao mau emprego da
Bíblia. Tomando mais um exemplo, o capítulo intitulado "As Lembranças Mais
Remotas" é iniciado com o versículo "Lembro-me destas coisas – e
dentro de mim se me derrama a alma" (Sl 42.4). Davi, na realidade,
nem se refere às suas "lembranças mais remotas", e sim às críticas e
ao escárnio atuais que está sofrendo daqueles que "dizem
continuamente [isto é, presentemente]: O teu Deus, onde está?" O
versículo "Escreve num livro todas as palavras que eu disse" (Jr
30.2), é citado logo abaixo do título do capítulo "Pronto, Objetivo,
Escreva". Este capítulo fala sobre "examinar o seu passado" e
"anotar as suas emoções" – nada poderia estar mais distante de
Jeremias escrevendo as Escrituras sob a inspiração do Espírito Santo!
Leão, castor, lontra e cão de caça?
Os autores mencionados são apenas um exemplo dentre um
exército de praticantes da cura interior, quer sejam psicólogos cristãos ou
cristãos leigos, os quais, embora possam ser sinceros, estão desviando milhões
de cristãos. Gary Smalley e John Trent, sucessos de vendas na área de
psicologia-pop, fortemente promovidos por James Dobson, apresentaram os seus
próprios temperamentos, baseando-se em quatro tipos de animais: leão, castor,
lontra e cão de caça!
Tipos de personalidade
Presumivelmente, descobre-se "o tipo de
personalidade" ou "temperamento" de um indivíduo através de um
teste do perfil da personalidade, tais como: Indicador do Tipo Myers-Briggs
(ITMB), Análise do Temperamento Taylor-Johnson (ATTJ), Sistema do Perfil
Pessoal (SPP), Teste do Perfil da Personalidade (TPP), Perfis Pessoais Bíblicos
(PBB), etc. Os testes de personalidade, embora populares, são duvidosos. A
personalidade humana com sua capacidade de escolha e um coração do qual Deus
diz que é "mais enganoso do que todas as coisas" resistem às fórmulas
predicativas e são por demais complexos para serem enquadrados em categorias.
Até mesmo as classificações supostamente promissoras de pessoas como
Personalidades do Tipo A (suscetíveis a ataques cardíacos), Tipo B (menos suscetíveis)
e Personalidades Suscetíveis ao Câncer, etc., estão sendo rejeitadas pela
impossibilidade de correlacionar cientificamente a doença com "o tipo de
personalidade".
Um grande número de autores cristãos populares e
palestrantes como o psicólogo H. Norman Wright e o analista financeiro Larry
Burkett são os responsáveis pela promoção destes testes incorretos e nocivos.
As teorias dos quatro temperamentos e da classificação da personalidade
banalizam a alma e o espírito humanos e fornecem desculpas para um
comportamento não-cristão. O foco está no eu, analisando-se as emoções, a
personalidade e a infância da pessoa na tentativa de descobrir por que ela
pensa e faz o que faz.
O foco em Deus, em Cristo e em Sua Palavra
Ao contrário, a Bíblia coloca o foco em Deus, em Cristo e
em Sua Palavra, transferindo-o de nós para Ele, do passado para o serviço
presente, e para a esperança da volta de Cristo. Ao invés de procurar
identificar a personalidade e o temperamento, consultando sistemas
especulativos relacionados à psicologia, astrologia e ocultismo, devemos deixar
que nossos pensamentos e ações sejam governados pela suficiente e inerrante
Palavra de Deus. A Sua promessa é que, se observarmos a doutrina em Sua
Palavra, Ele dirigirá nossa vida através de "repreensão, correção e
educação na justiça" (2 Tm 3.16). Como resultado, homens e mulheres
de Deus tornam-se maduros, aperfeiçoados e preparados para toda boa obra (v.
17). Pedro nos assegura que Deus "nos tem doado todas as coisas que
conduzem à vida e à piedade, pelo conhecimento completo daquele que nos chamou
para a sua própria glória e virtude" (2 Pe 1.3). Jesus declara que
aqueles que permanecem em obediência à Sua Palavra são Seus verdadeiros
discípulos, que "conhecem a verdade" e a quem a verdade libertará (Jo
8.31-32). Somente os que duvidam de tais promessas ou não querem seguir o
caminho da cruz voltam-se para teorias e terapias humanas.
Exemplos bíblicos
A Bíblia jamais faz alusão aos tipos de personalidade,
nem classifica as pessoas segundo habilidades ou fraquezas como meio de
identificar-lhes a capacidade e prognosticar-lhes o sucesso ou o fracasso na
obra de Deus. Rejeitando a armadura de Saul, com apenas uma funda e cinco
pedras, Davi subiu contra Golias, poderosamente armado, que aterrorizava todo o
exército de Israel. Qual foi o segredo? "Eu, porém, vou contra ti em
nome do Senhor dos Exércitos... Hoje mesmo, o Senhor te entregará nas minhas
mãos" (1 Sm 17.45-46). A confiança de Davi estava no Senhor e não em
si próprio. Mesmo que Davi não fosse hábil na funda, Deus o capacitaria a
acertar o alvo. Paulo chegou ao ponto de afirmar que Deus lhe dissera que o Seu
poder se aperfeiçoava na fraqueza de Paulo. Daí sua declaração: "...quando
sou franco, então, é que sou forte" (2 Co 12.10). Tais afirmativas
refutam todo o fundamento lógico dos testes de personalidade, da identificação
dos temperamentos, da auto-estima e do aumento do valor-próprio.
A Bíblia está repleta de exemplos de homens e mulheres
odiados, abusados e renegados pelos seus próprios familiares – homens e
mulheres solitários, sem amigos, faltos de talentos ou capacidade, mas que
triunfaram nas maiores adversidades porque confiavam em Deus. Estes heróis e heroínas
da fé desmentem a focalização no ego humanista e antibíblica, que é a base de
todas as psicologias pop da cura interior. Moisés é apenas um exemplo dentre
muitos outros.
O libertador Moisés
Quando Deus o chamou para ir ao Egito para libertar o Seu
povo, Moisés alegou ser incapaz de tal missão e pediu-Lhe que escolhesse outra
pessoa (Êx 3.11; 4.10-13). Por acaso Deus lhe aplicou algum teste de
personalidade para mostrar que Moisés tinha aptidão? O Senhor tratou da frágil
auto-estima de Moisés ou do seu baixíssimo valor-próprio? Ele lhe receitou a
cura interior para libertá-lo das memórias encobertas por ter sido abandonado
pelos seus pais e criado num lar adotivo, e da falta de identidade própria
resultante disto? Foi-lhe ministrado um curso de auto-aperfeiçoamento,
autoconfiança e sucesso? Pelo contrário, Deus lhe prometeu: "Eu serei
contigo"!
O "aconselhamento" bem-intencionado daqueles
que tentam ajudar os cristãos a se compreenderem pela focalização no eu, na
realidade, está privando os aconselhados da presença e do poder divinos que
Moisés experimentou. As forças e fraquezas humanas são irrelevantes neste caso.
O que vale é se o poder do Espírito Santo de Deus é ou não manifesto na vida da
pessoa. Muitos, se não a maioria dos personagens bíblicos, bem como dos heróis
da fé mais recentes, desde os primeiros mártires até os grandes pioneiros
missionários do século XIX, provavelmente falhariam nos atuais testes dos
perfis de personalidade.
Na verdade, Deus não escolheu Moisés por sua elevada
qualificação, mas por ser ele o homem mais manso na face da terra (Nm 12.3).
Por que Deus escolheria tal pessoa para enfrentar Faraó, o mais poderoso
imperador da época, no seu próprio palácio, para libertar Israel de suas
garras? Ele o fez para ensinar os israelitas a confiar nEle e não em homens
para seu livramento!
Os heróis da fé sem "terapias"
Jamais se encontra alusão de que José, Davi, Daniel, ou
qualquer outro herói da fé precisasse de terapias como as que estão por aí,
consideradas hoje tão vitais e eficazes. Foi quando Jó teve um vislumbre de
Deus e disse: "Eu me abomino [odeio] e me arrependo no pó e
na cinza" (Jó 42.6), que ele foi restaurado pelo Senhor. Foi também
quando Isaías teve a visão de Deus e clamou:"Ai de mim! Estou perdido! (Is
6. 1-8) que Deus pôde usá-lo. Precisamos mudar o foco de nossa atenção,
volvendo os olhos para o Senhor e não para nós mesmos.
Manifestação do poder de Deus em nossa fraqueza
Tenha sede de Deus! Procure conhecê-lO! O fruto do
Espírito não vem como resultado de compreendermos a nós mesmos através do uso
de técnicas ou análises humanistas, mesmo revestidas de linguagem bíblica, mas
pela manifestação do poder do Espírito Santo em nossa fraqueza. Seja fraco o
suficiente para que Ele possa usá-lo! (TBC 2/93, traduzido por David Oliveira
Silva)
Fonte: Dave Hunt www.chamada.com.br