domingo, 21 de outubro de 2012

Compreendendo o Universalismo Religioso


O processo de globalização tem um alcance muito além da economia. Como um sistema total, que incorpora elementos sociais e políticos, essa transição mundial foi colocada em marcha por diversas forças históricas e filosóficas. Neste contexto, a religião encontra-se na dianteira e no centro da busca por um novo paradigma internacional.
Em nenhum outro lugar isto é mais evidente do que na reorientação filosófica em direção ao universalismo religioso — a ideia que todas as religiões e fés são simplesmente caminhos divergentes que eventualmente levam ao mesmo objetivo final.
O controverso teólogo católico Hans Küng, defendeu essa posição no prefácio que escreveu para o livro The Meaning of Other Faiths: "... após o ecumenismo intraprotestante e intracatólico, chegamos irrevogavelmente à terceira dimensão ecumênica, o ecumenismo das religiões do mundo!" [1].
Marcus Braybrooke, presidente do Congresso Mundial das Fés, refletiu sobre como a religião poderá ser alterada em uma cultura global:
"Minha esperança — embora certamente não seja a esperança de todos no movimento interfé — continua sendo que o diálogo eventualmente trará a convergência ou, pelo menos, que a teologia se tornará uma disciplina inter-religiosa, ou uma 'teologia global'... um compartilhamento do Espírito. Somente esse compartilhamento tornará possível a recuperação dos valores espirituais que oferecem esperança para um mundo que está em agonia." [2].
Se uma teologia mundial ou uma "convergência" religiosa é parte do processo de globalização, podemos ver prenúncios dessa mudança hoje? A resposta pode ser encontrada em uma tendência cada vez mais aceita na sociedade: o universalismo religioso.
Este relatório tem três propósitos:
Demonstrar que essa transição no pensamento está ocorrendo agora.
Explorar alguns dos atores históricos que promovem e fazem avançar o universalismo religioso.
Contemplar a resposta cultural que poderá ocorrer pela aceitação do universalismo como uma norma social e analisar alguns paradoxos na posição.

Não Importa

"Não importa se você é cristão, ou budista, ou muçulmano, ou judeu", assim me garantiu um homem com quem conversei. Ele então fez uma pausa e enfatizou: "Somos todos iguais. Todas as religiões são caminhos para Deus."
Esta não foi a primeira vez que encontrei o universalismo religioso, mas foi um dos exemplos pessoais mais perturbadores, pois o indivíduo que defendia essa filosofia declarava ser um cristão. Em retrospecto, esse encontro não deveria ter sido uma surpresa. Muitas pessoas que afirmam serem cristãs estão rapidamente assimilando o universalismo religioso.
Jonathan Cooper, o administrador do site da Galeria de Arte de Nova Gales do Sul, escreve a respeito de uma experiência similar com uma pluralista pós-cristã: "Recentemente, uma amiga me surpreendeu ao dizer que não mais se identificava como uma cristã. Ela me disse que ainda orava, porém não mais aceitava a crença que há somente um caminho para Deus." [3].
Em setembro de 2007, em uma discussão no blog MotherJones, uma pessoa expressou uma opinião que é hoje compartilhada por muitos cristãos: "Sou cristão, porém acredito que existem muitos caminhos para Deus. Estou cansado de ouvir pessoas da minha fé dizerem que há somente um caminho..." [4].
Não há dúvida que o contexto religioso/cultural/histórico cristão do mundo ocidental está sob severa pressão. O pluralismo espiritual, outro termo que denota o universalismo religioso, se inseriu no tecido da sociedade que antigamente era reconhecida como predominantemente baseada no cristianismo. Assim, a confusão parece reinar de igual forma nos púlpitos e nos bancos das igrejas.
Em 2002, o Instituto Barna realizou uma pesquisa sobre os cristãos americanos — aqueles que afirmavam aderir a crenças cristãs específicas de acordo com as perguntas no questionário — em uma tentativa de identificar onde esse grupo demográfico se posicionava teologicamente. Barna descobriu que "9 de cada 10 adultos possuem pelo menos uma Bíblia e 8 de cada 10 se consideram cristãos, mas você nunca saberia isto a partir da imensa variedade de crenças religiosas professadas pela maior parte das pessoas..." [5].
Comentando sobre as inconsistências encontradas, o relatório do Instituto Barna observou:
"Se os padrões subjacentes a estas opiniões parecem ser inerentemente contraditórios, isto pode ser no mínimo parcialmente explicado pela disposição das pessoas de extrair conceitos de uma variedade de fontes teológicas conflitantes. Isto é talvez mais claramente evidente pela descoberta que uma pluralidade de adultos (44%) afirma que 'a Bíblia, o Alcorão e o Livro de Mórmon são todos diferentes expressões das mesmas verdades espirituais'. Apenas 38% dos americanos rejeitam essa ideia. Os únicos segmentos da população que divergem dessa visão são aqueles na faixa etária dos 57 anos ou mais (35% aceitam a noção, 36% a rejeitam e os 29% restantes não têm certeza); os evangélicos (10% concordam com a afirmação e 84% discordam); cristãos nascidos de novo não-evangélicos (40% concordam e 45% discordam); evangélicos (10% concordam com a afirmação, 84% discordam); e aderentes das igrejas protestantes (39% concordam e 47% discordam)." [6].
Além disso, no livro Soul Searching: The Religious and Spiritual Lives of American Teenagers, publicado em 2005, foi revelado que 60% dos jovens americanos aderem a alguma noção de religião pluralista ou universalista, como "Todas as religiões são igualmente verdadeiras", ou "Todas as religiões compartilham a mesma visão da verdade subjacente." [7].
Em outras palavras, 60% dos líderes do amanhã aderem ao universalismo hoje. Esta estatística mostra que nosso mundo está diante de uma enorme transformação social, religiosa e cultural.
Exemplificando a importância dessa transição a partir da perspectiva de um defensor, Ebrahim Patel, fundador do Núcleo Interfé Juvenil, sediado em Chicago, recentemente afirmou: "Acreditamos que se você quiser a paz no século 21, tem de criar o pluralismo religioso. E se você quiser o pluralismo religioso, tem de capacitar a mocidade para ser a vanguarda." [8].
Ironicamente, enquanto o universalismo religioso está sendo adotado pelos adolescentes americanos e cristãos professos ocidentais, os jovens nascidos em famílias hinduístas estão achando esse conceito inconsistente. O Dr. Frank Morales, um especialista em filosofias asiáticas e que também é um sacerdote ordenado no hinduísmo, escreveu a respeito de uma reclamação comum que encontra ao visitar pais hindus:
"Educamos nosso filho para ser um bom hindu. Nós o levamos ao templo nos feriados importantes. Quando ele tinha 13 anos, chegamos até a enviá-lo para passar fins de semana em acampamentos hindus. Agora, aos 23 anos, nosso filho abandonou o hinduísmo e se converteu para a religião (preencha os espaços em branco). Quando perguntamos como ele pôde ter deixado a religião de sua família, a resposta que ele nos deu foi: 'Vocês sempre me ensinaram que todas as religiões são iguais e que realmente não importa como uma pessoa adora a Deus. Qual é o problema se segui seu conselho e mudei de religião?" [9].

Procurando as Raízes

No continente americano, na Europa e nas nações ocidentalizadas da Oceania, o fenômeno do universalismo religioso parece derivar do movimento da contracultura do fim dos anos 1960s e início dos anos 1970s. Foi durante aquele tempo que o status quo da sociedade foi questionado e desafiado por uma geração que se rebelou abertamente contra as normas e padrões tradicionais.
Espiritualmente falando, foi naquela época que nasceu o moderno Movimento de Nova Era, que ajudou a definir o rumo para o pensamento pós-moderno atual. (O pós-modernismo é definido como uma trajetória cultural que rejeita os valores ocidentais e os parâmetros convencionais e aceita o relativismo, o pluralismo e a interdependência.).
Todavia, as raízes do pluralismo religioso ocidental são muito mais profundas. De fato, os fundamentos da mentalidade pós-moderna e universalista atual podem ser rastreados até diversos fatores filosóficos e sociais de centenas de anos atrás. Entretanto, para este artigo, analisaremos somente quatro fatores culturais dignos de nota e os examinaremos em uma estrutura de tempo que é relevante para nosso mundo moderno.

1. A Maçonaria

A Maçonaria é conhecida como a maior, mais antiga e mais proeminente sociedade secreta no mundo ocidental. Houve um tempo na América do Norte em que as lojas maçônicas podiam ser encontradas em quase todas as cidades pequenas, grandes e minúsculas. Os membros da Maçonaria exerceram papéis significativos em todos os principais aspectos estruturais dos Estados Unidos — desde a constituição do país até seu sistema educacional, desde suas comunidades militares e de inteligência até seus ofícios judiciais, pastorais e o presidencial. A Europa também foi enormemente impactada pela Maçonaria, como também outras regiões do globo. Milhões de homens buscaram a luz da Loja Maçônica e foram moldados pelos ritos e rituais da Ordem.
Para muitos de nós no século 21, um tempo em que a autoridade da Loja diminuiu em comparação com o crescimento de outros fatores culturais, é difícil entender plenamente o alcance que a Loja teve no tecido da comunidade maior. Entretanto, as marcas deixadas na sociedade são inconfundíveis e o universalismo é uma delas.
Em 1871, o Supremo Conselho da Jurisdição Sulista dos Estados Unidos, o mais alto órgão maçônico no país, publicou a obra de seu líder mais estimado, o ex-general-de-brigada confederado Albert Pike.
"Ela [a Maçonaria] reverencia todos os grandes reformadores. Ela vê em Moisés, o Legislador dos judeus, em Confúcio e Zoroastro, em Jesus de Nazaré e no Iconoclasta Árabe, Grandes Instrutores da Moralidade e Eminentes Reformadores, se não mais, e permite que todo irmão da Ordem atribua a cada um desses um elevado e até Divino Caráter, conforme seu Credo e Verdade requeira. Assim, a Maçonaria não desacredita verdade alguma e não ensina a descrença em credo algum..." [10].
Pike também descreveu a Loja como um lugar em que "o cristão, o hebreu, o muçulmano, o hindu, os seguidores de Confúcio e de Zoroastro, podem se reunir como irmãos e se unirem em oração ao único Deus que está acima de todos os Baalim..." [11].
Ao longo dos anos, outros filósofos da Maçonaria defenderam esse universalismo como a expressão religiosa e filosófica maior. Manly P. Hall, certamente um dos mais importantes maçons do século 20, escreveu o seguinte em seu livro The Lost Key of Freemasonry (As Chaves Perdidas da Maçonaria):
"O verdadeiro maçom não está limitado por credos. Ele entende com a iluminação divina de sua loja que, como um maçom, sua religião precisa ser universal. Cristo, Buda, ou Maomé, o nome pouco significa, pois ele reconhece a luz e não o portador. Ele adora em todo santuário, inclina-se diante de todo altar, seja em templo, mesquita ou catedral, compreendendo com seu verdadeiro entendimento a unidade de toda a verdade espiritual... todas as religiões são apenas uma história contada de diferentes maneiras por pessoas cujos ideais diferem, mas cujo propósito maior está em harmonia com os ideais maçônicos... Nenhum verdadeiro maçom pode ter a mente estreita, pois sua Loja é a expressão divina de toda a amplidão." [12].
Além disso, como a Associação do Serviço Maçônico nos diz em seu relatório, Universality of Freemasonry (A Universalidade da Maçonaria), o objetivo da Ordem é unir os homens "em uma irmandade pacífica baseada com o vínculo comum de adoração do único Deus de nós todos." [13].
Nada disto teria muito significado se a influência da Loja sobre a cultura e a comunidade nos séculos 19 e 20 estivesse relegada a um mero aspecto secundário. Mas, não é o caso. Na América do Norte somente, centenas de milhares, talvez até milhões de homens frequentadores de igrejas ajoelham-se diante do altar da Maçonaria — incluindo um grande número de pastores, presbíteros, diáconos e professores da Escola Dominical.
Esses homens compreendem o universalismo religioso que é subjacente na Loja Maçônica? Muito provavelmente não, e pode-se afirmar hoje que um grande número dos membros ainda é relativamente ignorante a esse respeito. Afinal, a maioria dos maçons vê a Loja como pouco mais do que uma fraternidade social e raramente investiga as profundezas da filosofia esotérica que é encontrada em seus rituais e ensinos. Por um lado, os líderes maçons já declararam categoricamente que a organização esconde esse conhecimento mais profundo de seus membros, até o tempo em que eles estejam preparados para compreender e aceitar essas "verdades mais elevadas". [14].
Expandindo essa faceta da ignorância religiosa, Manly P. Hall explica:
"Todavia, mesmo se os assim chamados segredos da Maçonaria fossem proclamados publicamente, a Fraternidade estaria absolutamente segura, pois certas qualidades espirituais são necessárias para que os verdadeiros segredos maçônicos possam ser compreendidos pelos próprios irmãos." [15].
"Na verdade, existem blocos entre os irmãos que gostariam de divorciar a todo o custo a Maçonaria tanto da filosofia quanto da religião. Entretanto, quando pesquisamos os escritos de maçons eminentes, descobrimos um ponto de vista unânime, ou seja, que a Maçonaria é um organismo religioso e filosófico." [16].
Há pouca dúvida que esse componente "religioso e filosófico", que coloca o universalismo em seu centro, tem sido um fator sutil, porém influente nas vidas de milhões de clérigos e líderes da comunidade. A estrutura social pluralista e pós-moderna dos dias atuais deve muito aos fundamentos lançados pela Maçonaria.

2. A Teosofia

Poucos no público geral já ouviram falar na Teosofia. Ao contrário da Maçonaria, a Teosofia não recebeu o reconhecimento geral da comunidade e a credibilidade que foi conferida à Loja Maçônica. Entretanto, o papel da Teosofia na promoção do universalismo é colossal.
A Teosofia, que existe de forma organizada desde o fim do século 19, mistura as religiões orientais com o ocultismo ocidental. Cherry Gilchrist, autora de Theosophy: The Wisdom of the Ages, explica a teosofia como a "busca da sabedoria".
"A Teosofia incorpora uma procura pela sabedoria que teve de lutar contra as visões religiosas fechadas do século 19 e início do século 20. Outras linhas esotéricas e ocultistas daquele tempo estavam criando seus próprios caminhos silenciosamente... A Teosofia objetivava abrir as portas para revelar o esplendor da sabedoria universal, uma sabedoria enterrada no coração de todas as genuínas tradições religiosas e ocultistas. A partir dessa perspectiva ampla, uma nova visão nasceu, pois um novo contexto teve de ser criado para conter e reformular essa sabedoria. A Teosofia ajudou a abrir a mente humana para as verdades universais e criar uma nova estrutura por meio da qual elas podem ser compreendidas." [17].
Destacando sua história inicial e a obra de sua excêntrica e eletrificada fundadora, Helena Petrovna Blavatsky, Gilchrist explica a prontidão do mundo ocidental em aceitar de braços abertos Blavatsky e seus ensinos:
"Se pudermos nos imaginar vivendo na Europa e nos EUA no século 19, as limitações em visão que existiam tornam-se muito aparentes, pois a ciência materialista estava ganhando a supremacia e o cristianismo estava em uma fase de camisa de força em que os fiéis não pensavam por conta própria, nem tentavam encontrar seu próprio caminho nos mistérios sagrados. Espiritualmente falando, a civilização ocidental desejava aspirar ar fresco. Hoje, assumimos como uma coisa natural a facilidade que temos de obter estudos esotéricos e religiosos de todos os tipos, mas essa abertura deve muito ao advento da teosofia. Blavatsky apareceu como uma força de primeira importância na cena europeia e, embora seus ensinos tenham sido vistos com desolação pelos ortodoxos, para aqueles que estavam desejosos por novos horizontes, eles abriram uma porta para outros mundos." [18].
Blavatsky ensinava que todas as religiões se originaram da mesma fonte básica e que toda a humanidade deveria se voltar para os antigos mistérios pagãos e para as religiões orientais na busca por sabedoria. Além disso, na busca pela verdade, a doutrina esotérica era interpretada e extraída do Judaísmo, do Cristianismo e do Islã, levando assim o indivíduo para a conclusão que todas as fé emanaram de uma Deidade universal. William Q. Judge, outro líder inicial do movimento, foi direto nessa aplicação universal: "Somente a Teosofia, inclusiva de todos os sistemas e de todas as experiências, dá a chave, o plano, a doutrina e a verdade." [20]. Essa declaração dá significado à divisa da Teosofia: "Não há religião superior à verdade."
O objetivo primordial da Teosofia, de acordo com a fundadora H. P. Blavatsky, é "reconciliar todas as religiões, seitas e nações debaixo de um sistema comum de ética, baseado nas verdades eternas." [21].
Para este fim, a Sociedade Teosófica e suas várias ramificações levaram mestres e gurus orientais para os EUA e para a Europa. Na verdade, os líderes da Teosofia produziram o "renascimento espiritual do budismo e do hinduísmo" no Ocidente durante o início do século 20. [22].
Lojas da Teosofia também foram abertas na Inglaterra, Canadá, Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia. Na Alemanha, os ensinos teosóficos exerceram um papel no desenvolvimento da ideologia esotérica do nazismo, incluindo o conceito do arianismo. [23]. Na Índia, onde a Sociedade Teosófica estabeleceu sua sede internacional em Madras, a sociedade fundou centenas de escolas teosóficas para as crianças. Hoje, o movimento ainda está ativo, com filiais e subgrupos envolvidos no trabalho interfé global e até na política internacional, como por exemplo os esforços da Lucis Trust / World Goodwill em apoio à Organização das Nações Unidas. [24].
Como declarado anteriormente, a Teosofia é relativamente desconhecida do público, porém sua influência é inegável. A autora Gilchrist nos lembra das consideráveis realizações que essa busca pela "verdade" teve sobre o mundo ocidental:
"Embora sua origem esteja no século 19, a perspectiva teosófica tem muito em comum com a da Nova Era e, pode-se dizer com justiça, que foi o ímpeto da Teosofia que permitiu que todo o Movimento de Nova Era viesse a existir." [25].
"A Teosofia já alcançou muito em trazer os ensinos do budismo e a filosofia da Índia para o Ocidente e em abrir a mente europeia para a ideia que nenhuma religião ou sistema de crenças tem o monopólio da verdade." [26].

3. O Movimento Unitário-Universalista

Pequeno em número e relativamente novo como uma religião, [27] o Unitário-Universalismo (UU) é uma igreja organizada que permite que fiéis de todas as formações espirituais se unam na busca pela sabedoria universal.
Com relação à sua abrangência geográfica, a religião UU é encontrada majoritariamente nos Estados Unidos, com mais de 1.000 congregações espalhadas pelo país. Existem igrejas unitário-universalistas em outros países, porém tipicamente são pequenas e isoladas em comparação com o cenário que existe nos EUA.
Embora o Movimento Unitário-Universalista tenha sido criado nos fundos de duas congregações cristãs hereges, a Igreja Universalista (que acreditava na salvação universal) e a Fé Unitária (que rejeitava as doutrinas da trindade e do pecado), o UU atual não adere a credos, dogmas e doutrinas. Essencialmente, a fé unitário-universalista cria um espaço de "crença positiva" para as pessoas de todas as religiões se reunirem e adorarem em tolerância, com o objetivo de trazer paz à família humana.
Com esta visão de unidade na diversidade, o movimento UU se apresenta como um modelo para a harmonia e progresso da humanidade, vendo a igreja como uma síntese de vários sistemas de crenças e "jornadas espirituais". De acordo com uma pesquisa regional realizada em 1997, os membros do UU aderem aos seguintes sistemas de crenças: humanistas (54%), agnósticos (33%), centrado na Terra (31%), ateístas (18%), budistas (16,5%) e pagãos e cristãos registrando ambos 13,1%.
James Casebolt, o acadêmico da Universidade de Ohio que realizou a pesquisa, comentou: "O típico respondente sentia a necessidade de recorrer a três ou quatro termos para conseguir descrever suas visões teológicas." [28].
Essa abertura para todas as expressões espirituais permite que o adorador da UU veja cada religião como detentora de um elemento da verdade, e que a igreja UU atue como um catalisador para o desenvolvimento pluralista. Escrevendo sobre o sistema unitário um ano antes da fusão com a denominação universalista, o autor Jack Mendelsohn coloca esta dimensão inter-religiosa em foco:
"É muito atraente pensarmos em nós mesmos como uma ponte para as muitas religiões do mundo. Afinal, não temos mitos especiais a defender, nem credos a impor. Estamos abertos para tudo o que é eticamente melhor nas religiões do mundo e, por meio da liberdade, da razão e da tolerância, nos sentimos preparados para extrair de cada uma das grandes fés seus fervores morais." [29].
Entretanto, o unitário-universalista busca um prêmio ainda maior: "Afirmar a unidade do universo, a unidade da família humana, a unidade da verdade já descoberta e da que ainda está por descobrir, a validade universal da livre investigação e o nascimento do homem universal." [30].
Logicamente, para que esse "homem universal" possa surgir, o pluralismo religioso precisa se desenvolver como um padrão político e cultural. Aqui está o ponto crucial. Ao contrário da Maçonaria, que influencia por meio de um relacionamento com a comunidade, e ao contrário da Teosofia, que introduziu as religiões orientais no Ocidente e deu origem ao Movimento de Nova Era, a contribuição unitária ao universalismo religioso reside em outra arena: no ativismo social.
Se os unitários-universalistas deixaram sua marca em algum lugar, é na definição de tendências. Historicamente, a congregação unitária apoiou o abolicionismo, o movimento da temperança (NT: Uma campanha pela redução no consumo de bebidas alcoólicas) e as liberdades civis. Mais recentemente, a Igreja Unitário-Universalista endossou os estilos de vida dos homossexuais, lésbicas e transgêneros, e entrou na história ao se tornar "a primeira denominação importante nos EUA a adotar uma posição de apoio ao reconhecimento jurídico do casamento entre indivíduos do mesmo sexo." [31].
O Movimento Unitário-Universalista também apoia as políticas pró-aborto, as posições ambientalistas centradas na Terra, soluções de gestão internacional para o aquecimento global e a legalização dos narcóticos ilícitos, entre uma infinidade de outras questões sociais "progressistas". [32]. O pluralismo religioso também se tornou um tipo de ponto de manifestação sociopolítico, levantando o estandarte da tolerância espiritual como norma para o público e, ao mesmo tempo, rejeitando dogmaticamente o fundamentalismo religioso. [33].
O ativismo e o pluralismo unitário-universalista são reconhecidos e aplaudidos dentro dos círculos acadêmicos esquerdistas e progressistas, bem como no círculo da justiça social.
Consequentemente, não é incomum encontrar grupos de estudos do unitário-universalismo nos campi universitários e ver essa filosofia adaptada nos cursos de artes liberais. A Escola Teológica de Harvard, uma das mais proeminentes escolas de graduação nos EUA, tem uma longa associação com a religião unitária e recentemente abriu vagas para professores no curso de Estudos Unitário-Universalistas. [34].
Walter Martin, um autor cristão que investigou as seitas, reconheceu os avanços que o movimento unitário-universalista fez dentro desse segmento da sociedade:
"Com suas atitudes, crenças e práticas humanistas e progressistas, não é maravilha que o movimento desfrute de popularidade na progressista América." [35].
Embora a Igreja Unitário-Universalista seja numericamente insignificante, ela exerce um papel importante em modificar a percepção da sociedade com relação à religião e à espiritualidade.

4. A Fé Bahá’í

Com muito mais aderentes do que o Movimento Unitário-Universalista, e com uma abordagem inegavelmente global, a fé Bahá'í precisa ser mencionada como uma importante contribuição para o universalismo religioso.
A religião Bahá'í surgiu na Pérsia e tem origem no Islamismo, porém se transformou em uma religião independente com suas próprias revelações especiais. Em comparação com as outras religiões que existem no mundo, o movimento Bahá'í é relativamente novo, pois surgiu nos anos 1850s e 1860s.
Um dogma central do Bahaísmo é a crença que todas as religiões têm uma origem comum. Como uma fé organizada, ela "reconhece a unicidade essencial das grandes religiões do mundo." [36]. One Country, a publicação da Comunidade Internacional Bahá'í, explicou isto da seguinte forma:
"A Fé Bahá'í é capaz de unir pessoas de formação tão diversa porque ensina que existe somente um Deus, que em toda a história se revelou por meio de uma série de mensageiros divinos — incluindo Abraão, Krishna, Zoroastro, Moisés, Buda, Jesus e Maomé." [37].
Este atributo religioso universal também foi expresso na Declaração Bahá'í de 1993 à Comissão dos Direitos Humanos da ONU:
"... a revelação religiosa é contínua e progressiva e que, desde o início da história humana, Deus periodicamente enviou educadores divinos ao mundo para guiar a humanidade. O aparecimento desses educadores divinos — Krishna, Buda, Zoroastro, Abraão, Moisés, Cristo, Maomé e, em nossa época atual, o Bab e Baha'u'llah — significa a fundação de uma nova religião, porém nenhuma dessas religiões é realmente nova; cada uma delas é um estágio do desenvolvimento da mesma verdade religiosa que procede do mesmo Deus." [38].
Como a Maçonaria, a Teosofia e a Igreja Unitário-Universalista, o significado do movimento Bahá'í está centrado em quem ele influencia. Compreender este aspecto requer que entendamos sua visão.
O endosso da fé Bahá'í ao universalismo religioso deriva de seus ensinos a respeito de um vindouro sistema de um mundo unificado, completo com um governo internacional, uma única moeda global e uma fé universal. [39]. Prevendo o tempo quando o mundo será pacificamente gerenciado por uma entidade centralizadora, econômica, política e religiosa, estabelecida em grande parte por meio do trabalho da comunidade Bahá'í — a fé Bahá'í apoiou consistentemente esforços internacionais, como a criação da Liga das Nações. Quando a Organização das Nações Unidas foi fundada, a fé Bahá'í abraçou esse novo organismo como o veículo principal para a governança global. Hoje, a Comunidade Internacional Bahá'í (CIB) — que representa a religião na comunidade mundial — defende abertamente essa visão planetária. No processo, a Comunidade se tornou um dos mais veementes proponentes do fortalecimento da ONU.
Fornecendo alguns detalhes superficiais sobre o lado operacional dessa conexão ONU/Bahá'í, a CIB escreve:
"Representantes da fé Bahá'í estavam presentes em San Francisco, em 1945, durante a fundação das Nações Unidas. Em 1947, as comunidades Bahá'í dos EUA e do Canadá foram reconhecidas pelo Departamento de Informações Públicas (DIP) da ONU. No ano seguinte, em 1948, a Comunidade Internacional Bahá'í foi reconhecida pelo DIP como uma organização não-governamental internacional. Em maio de 1970, a CIB recebeu o status consultivo junto ao Conselho Econômico e Social (ECOSOC) da ONU, permitindo um grau maior de interação com o Conselho e com seus órgãos subsidiários nos esforços de promover o desenvolvimento econômico e social em todo o mundo. Em março de 1976, a Comunidade Internacional Bahá'í recebeu status consultivo junto ao UNICEF (Fundo das Nações Unidas para as Crianças), estendendo similarmente as oportunidades para a interação com as Nações Unidas para promover a saúde, educação e bem-estar das crianças." [40].
Desde aquele tempo, a Comunidade Bahá'í estendeu grandemente suas atividades junto às Nações Unidas, trabalhando intimamente com a UNESCO, a OMS (Organização Mundial de Saúde) e com o Programa de Meio Ambiente da ONU. O pessoal da Comunidade Internacional Bahá'í também se assenta em diversos comitês da ONU e em grupos especializados de defesa de direitos, dando voz à sua visão de um governo global e uma fé mundial. Além disso, ao longo dos anos, os representantes da fé Bahá'í participaram em inúmeros foros, encontros de cúpula, conferências e grupos de trabalho patrocinados pela ONU — relacionar todos aqui requereria um livro inteiro.
A primeira experiência substancial que tive da influência da fé Bahá'í na ONU ocorreu quando participei do Foro do Milênio, no ano 2000. Inaugurando o evento estava Techeste Ahderom, o principal representante da Comunidade Internacional Bahá'í na ONU. Na verdade, ele era o copresidente oficial do Foro do Milênio e, por trás dos bastidores, a CIB estava muito envolvida em apoiar e manter o Comitê Executivo do Foro. [41].
A influência Bahá'í na ONU é muito abrangente, especialmente no campo da promoção interfé. Respondendo a uma conferência da ONU de um dia, co-patrocinada pela Comunidade Internacional Bahá'í, sobre cooperação interfé em 2005, Jean Ping, presidente da Assembleia-Geral da ONU declarou: "É importante que ao construirmos nossas civilizações, aprimoremos a cooperação interfé entre os governos, a sociedade civil e o sistema das Nações Unidas." [42].
Jeffery Huffines, um representante da CIB e membro do Comitê de Organizações Não-Governamentais Religiosas na ONU, foi igualmente franco:
"Há um claro reconhecimento na ONU que, se a religião é parte do problema, então também precisa ser parte da solução." [43].
Ora, a solução, segundo a religião Bahá'í, somente pode ser encontrada por meio de um padrão global e politicamente aceitável de pluralismo religioso. Esta é a mensagem que, graças em grande parte à Comunidade Internacional Bahá'í, está sendo ecoada pelos corredores da ONU.
Maçonaria, Teosofia, Unitário-Universalismo e a Comunidade Bahá'í — todos exerceram um papel histórico e contemporâneo em remodelar os valores e atitudes ocidentais em direção ao universalismo religioso. O pós-modernismo, com seu pluralismo religioso, é em grande parte uma derivação desses movimentos subjacentes. Hoje, muitos pastores cristãos, educadores preocupados e multidões de pessoas nascidas nos anos 1950s estão se perguntando o que aconteceu com a sociedade. Como as nações do Ocidente fizeram a transição tão rápida dos padrões cristãos para a confusão moral e espiritual?
Quais são as implicações para a sociedade?

Onde o Pneu Pega a Estrada

Pouco tempo atrás, um professor do Ensino Fundamental me contou que o programa de Estudos Sociais que estava sendo adotado em sua escola era essencialmente o currículo definido pela ONU. As declarações e as realizações da ONU eram o assunto central e tudo parecia estar baseado em um projeto global, com a cidadania global em vista. Parte desse programa de Estudos Sociais era ensinar a "tolerância religiosa" como um direito humano fundamental.
Ser tolerante com os outros é uma atitude nobre, mas o contexto não era desenvolver características altruístas, mas promover as filosofias interfé e universais.
Em 1997, tive a oportunidade de testemunhar em primeira mão como o universalismo religioso, sob o disfarce da tolerância, seria aplicado nas escolas públicas canadenses. Como um participante do Congresso Para a Juventude Cidadania Global 2000, um evento patrocinado em parte pelo governo do Canadá, observei como os educadores e as crianças em idade escolar foram levados a adotar as filosofias de cidadania mundial. O universalismo religioso foi apresentado como necessário para a criação de um novo conjunto de valores globais.
O orador convidado para o evento era Robert Muller, ex-assistente do Secretário-Geral da ONU. Levando o pluralismo espiritual ao seu objetivo final, ele disse aos participantes: "... somos todos unidades cósmicas. É por esta razão que as religiões nos dizem que somos divinos. Somos energia divina... está em suas mãos decidir se a evolução neste planeta continuará ou não." [44].
O objetivo da conferência, sem qualquer surpresa, era incorporar esse pensamento dentro do sistema educacional da cidade de Vancouver, na Colúmbia Britânica, e depois cruzar o país por meio do currículo de Estudos Sociais e outras vias educacionais. (Para saber mais sobre este evento, leia a edição de março de 2007 da Forcing Change.) Os jovens canadenses seriam impactados, de uma extremidade do país até a outra, com a mudança sutil do sistema de valores de toda uma geração.
Olhando para o futuro não tão distante, como será a sociedade? Aqui estão alguns pontos a considerar:
Para os cristãos que adotam a interpretação literal da Bíblia e creem nas afirmações de Jesus Cristo, expressar essas convicções será considerado culturalmente prejudicial. As afirmações de verdade religiosa exclusiva poderão ser rotuladas como crime de ódio e receber uma legislação punitiva. As igrejas, organizações paraeclesiásticas e as missões cristãs poderão ser colocadas sob uma luz cultural negativa, a não ser que mudem a mensagem para refletir a ética pluralista.
A educação será baseada em propaganda, movendo o foco do ensino para o reino da modificação do comportamento e das crenças. Esta já é uma tendência dominante na educação no Sistema Público de Ensino.
Alternativas espirituais serão incentivadas, com o crescimento resultante do misticismo, do ocultismo e das práticas pagãs.
A moralidade em geral declinará. Os padrões de honestidade, integridade e veracidade não mais serão mantidos em um terreno firme. O relativismo moral prevalecerá.
Muito possivelmente, uma tirania burocrática de "paz" e uma tolerância com tudo aparecerão, preenchendo o vácuo da razão e da verdade abandonadas. Esse entrincheiramento político já foi observado na história, com o resultado que a mão pesada do governo se faz sentir.
As sementes de todos esses resultados potenciais já existem e, em muitos aspectos, os pontos citados acima não refletem um cenário futuro, mas movimentos contemporâneos que já são discerníveis.
Compreendendo como a sociedade está adotando o universalismo religioso, o solo em que ele cresceu e o quadro grande que apresenta, é imperativo entender o tempo em que vivemos.
Entretanto, existem problemas no arraial interfé e pluralista.
Aceitar o universalismo religioso levanta alguns obstáculos lógicos. Se todas as "tradições de fé" são válidas e irradiam a verdade, então as expressões espirituais desviantes também precisam ser toleradas. Até o mais esclarecido pluralista tem dificuldade em engolir esta linha.
Em 2001, testemunhei esse tipo de impasse ao comparecer a um encontro interfé em uma igreja unitária-universalista na Flórida. Durante o intervalo, conversando com um grupo de membros do unitário-universalismo, a discussão se voltou para os ideais do pluralismo. Um dos participantes, obviamente perplexo, apresentou a seguinte questão: "— O que faremos com os satanistas?"
Um dilema interessante: a posição de tolerância para todos e verdade em tudo tem de aceitar a validade de todas as experiências e expressões espirituais. Portanto, reconhecer somente os fundamentos morais e dogmas das "grandes fés" à custa das religiões fora da corrente dominante é hipocrisia e cheira a exclusivismo. Para ser intelectual e logicamente consistente, a unidade na diversidade tem de aceitar tudo ou nada. O questionador também acrescentou: "— E os cultos que realizam sacrifícios humanos?"
Observei admirado como a conversa foi de uma posição "intelectual" de tolerância para o silêncio constrangedor. Ninguém respondeu. Ninguém queria defender o nazismo, que tinha uma inegável aplicação metafísica e mística; ninguém queria defender a seita Portal do Céu; ninguém queria se associar com esse tipo de religião.
O questionador tinha batido em uma das falácias mais claras do universalismo: independente de quão frequentemente o mantra do pluralismo seja repetido, todas as religiões não são a mesma coisa.
Outro paradoxo aparece quando examinamos o universalismo religioso. Dizer que todas as religiões são iguais é como dizer que nenhuma religião existe, e que a verdade, da mesma forma, não pode ser "verdade".
Isto também segue um caminho previsível. Quando rejeita Deus e a verdade, a humanidade se torna o árbitro proclamado, autorizando a definição de novos padrões e novos deuses, como a Terra, o governo, o poder e até o próprio homem.
Autor: Carl Teichrib, Forcing Change, Volume 2, Edição 1.

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