O Senhor Jesus
disse à igreja de Éfeso: “Tenho, porém, contra ti que abandonaste o teu
primeiro amor. Lembra-te, pois, de onde caíste, arrepende-te e volta à prática
das primeiras obras; e, se não, venho a ti e moverei do seu lugar o teu
candeeiro, caso não te arrependas” (Ap 2.4-5).
Infelizmente,
essa ameaça de Jesus logo tornou-se realidade. A igreja de Éfeso, que se
encontrava onde hoje é a Turquia, desapareceu e não há praticamente mais nada
que a lembre. No lugar onde antes brilhava a luz do Evangelho por meio da
igreja local de Éfeso hoje se proclama o islamismo. Onde antes havia o
“candeeiro” da Palavra de Deus, hoje estão os minaretes das mesquitas
islâmicas.
A igreja tinha
abandonado o primeiro amor, não voltou a ele e isso teve conseqüências
desastrosas. Mas, afinal, o que é esse primeiro amor?
O
que o“primeiro amor” não é
Ele não é
necessariamente o amor que tínhamos no começo de nossa vida cristã (do ponto de
vista puramente temporal), quando encontramos a Jesus. O verdadeiro amor é
mutável, mas não no sentido de diminuir repentinamente. Vamos ver o exemplo do
casamento. Há uma fase inicial de “paixão”, e uma fase posterior de “amor”. Na
hora da “paixão”, os sentimentos têm um papel muito forte. Mais tarde essa
agitação emocional diminui, mesmo que o amor não tenha diminuído; ele apenas
ficou mais constante, afeiçoado e fiel. No começo, o coração bate forte quando
abrimos uma carta da pessoa por quem nos apaixonamos. Depois de vinte anos de
casamento, provavelmente não sentimos mais tanta emoção quando recebemos um
cartão ou uma carta do cônjuge, mesmo que o amor seja muito grande. Isso
significa que o amor verdadeiro é mais do que um simples sentimento, que tem
papel tão importante quando alguém se apaixona. Depois que a relação se
consolida e alguns anos de casamento se passam, o amor de um pelo outro não
depende mais só dos sentimentos, mas fica mais constante e profundo.
Podemos comparar
a “paixão” a um motor que é ligado: ele precisa da ignição antes de funcionar.
Depois, porém, ele continua funcionando de forma constante, sem que a ignição
tenha de ser constantemente acionada. O carro está andando, e nós ficamos
satisfeitos em seguir adiante, em direção ao objetivo desejado. Isso ilustra o
amor permanente.
Na verdade, é
perfeitamente normal que depois de alguns anos seguindo a Jesus, um filho de
Deus não tenha mais o mesmo sentimento ou a mesma emoção do início de sua vida
cristã. Mas isso não significa necessariamente que agora amemos menos a Jesus
do que logo depois da conversão. Podemos estar no primeiro amor mesmo sem essas
emoções que nos assaltam.
O
que é o“primeiro amor”
Em minha
opinião, a expressão “primeiro amor” não se refere tanto à característica
temporal, e, sim, muito mais à característica qualitativa, à importância. O
essencial é que o amor a Jesus ocupe o primeiro lugar em minha vida, isto é,
que ocupe a posição de principal e melhor amor; importa que as
prioridades estejam na ordem correta.
Quando um marido
passa a colocar os esportes, a televisão ou seu hobby à frente de sua
esposa com o passar dos anos (mesmo que lhe seja fiel, que ainda goste muito
dela, que não consiga mais imaginar sua vida sem ela e que ela continue
cuidando dele o tempo todo), então ele abandonou o seu primeiro amor em relação
a ela.
Quando a paixão
e a devoção a Jesus diminuem, o primeiro amor por Ele já foi abandonado. Esse
principal e melhor amor não pode ser substituído por perfeccionismo, nem por
esforços e perseverança, nem evitando maus pensamentos e ações. Revelar o mal,
trabalhar e sofrer para o Senhor também não resolve. Isso tudo é bom e
necessário, afinal, o próprio Senhor reconhece que são atitudes elogiáveis (Ap
2.2-3); mas elas também podem partir de um hábito puramente mecânico, e ficar
engessadas em formalismo e tradicionalismo.
Por ocasião de
seu jubileu de ouro no serviço militar, Paul von Hindenburg (1847-1934) [que
mais tarde foi presidente da Alemanha], recebeu altas honrarias. Sua resposta
foi modesta: “À guerra, o espírito – ao rei, o coração – à pátria, o sangue – a
Deus, a honra!” Mas Deus quer nosso amor inteiro e completo, sem dividi-lo com
ninguém (Mt 22.37). Nosso espírito, nosso coração e nosso sangue pertencem
somente a Ele. O Senhor não quer somente a honra, mas toda a devoção dos que
que se voltam para Ele em amor.
Em muitas igrejas
tudo corre conforme os padrões bíblicos, e não há nada que se possa dizer
contra elas. Ainda assim, falta o primeiro amor ao Senhor, pois a vida
estruturada da igreja assumiu o lugar de Jesus Cristo. O Senhor Jesus sempre
deve estar em primeiro lugar. Esse primeiro amor a Ele é que deve impulsionar o
que fazemos por Ele, e não o contrário. Penso que era isso que Jesus estava
querendo dizer aos cristãos da igreja em Éfeso: para eles, agir em nome do
Senhor vinha antes, e o amor profundo a Jesus estava só em segundo lugar; a
rotina descompromissada tinha passado acima da vida espiritual.
Um
exemplo de primeiro amor por Jesus
Lemos em Lucas
10.38-42: “Indo eles de caminho, entrou Jesus num povoado. E certa mulher,
chamada Marta, hospedou-o na sua casa. Tinha ela uma irmã, chamada Maria, e
esta quedava-se assentada aos pés do Senhor a ouvir-lhe os ensinamentos. Marta
agitava-se de um lado para outro, ocupada em muitos serviços. Então, se
aproximou de Jesus e disse: Senhor, não te importas de que minha irmã tenha
deixado que eu fique a servir sozinha? Ordena-lhe, pois, que venha ajudar-me.
Respondeu-lhe o Senhor: Marta! Marta! Andas inquieta e te preocupas com muitas
coisas. Entretanto, pouco é necessário ou mesmo uma só coisa; Maria, pois,
escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada”.
Marta empenhou
tudo para que Jesus fosse recebido dignamente com a melhor comida e bebida, e
com certeza não fez isso sem amor. Mesmo assim, o Senhor precisou adverti-la;
mas sua irmã Maria foi elogiada por Ele. Devemos fazer uma coisa sem deixar a
outra de lado – mas as prioridades devem estar na ordem certa. Esse
acontecimento mostra que Maria escolheu a atitude melhor, o que nos dá um
exemplo do “primeiro amor” a Jesus. Importa primeiro sentar aos Seus pés, ouvir
a Sua palavra e reconhecer a Sua vontade. Esse primeiro amor ao Filho de Deus
não existe sem que a Sua vontade seja feita. Mais tarde, a mesma Maria derramou
o unguento precioso sobre os pés de Jesus. João 12.3 nos relata essa ação: “Então,
Maria, tomando uma libra de bálsamo de nardo puro, mui precioso, ungiu os pés
de Jesus e os enxugou com os seus cabelos; e encheu-se toda a casa com o
perfume do bálsamo”. Maria “escolheu a boa parte”, a melhor, a
superior, “e esta não lhe será tirada”.
Que contraste
com as palavras de Jesus: “Tenho, porém, contra ti que abandonaste o teu
primeiro amor”. O primeiro amor havia sumido e por isso a igreja de Éfeso
corria perigo de perder sua luminosidade. No exemplo acima, quem brilha mais?
Marta ou Maria?
“Primeiro
Jesus!”
A visita de
Jesus à casa de Maria e Marta e o ato de amor de Maria mostram claramente a
importância que o Senhor dá à dedicação completa de todo o nosso amor a Ele, ao
nosso viver com Ele e a partir dEle e ao serviço devotado que brota dessa
ligação vital. O princípio é este: primeiro amor profundo a Jesus e só então
serviço em Seu favor. É muito importante ouvi-lO e adorá-lO por meio do estudo
da Bíblia, da oração, do silêncio em Sua presença. Infelizmente é possível
esgotar-se pelo Senhor mesmo que tenhamos nos tornado indiferentes em relação à
comunhão com Ele. Devemos fazer o primeiro sem desprezar o segundo – ou teremos
abandonado o primeiro amor.
O principal amor
deve ser devotado ao Senhor Jesus, que amou primeiro os Seus – por meio de Seu
sofrimento e da Sua morte vicária na cruz, assim como através de Sua
ressurreição e ascenção aos céus. Em outras palavras: Ele precisa ser o
primeiro em nossas vidas. O Senhor Jesus expressou dessa forma radical a
seriedade absoluta com que encara esse primeiro amor a Ele: “Quem ama seu
pai ou sua mãe mais do que a mim não é digno de mim; quem ama seu filho ou sua
filha mais do que a mim não é digno de mim” (Mt 10.37).
A palavra grega
para “primeiro” é “protos”, que refere-se menos à importância cronológica e
mais à importância qualitativa. Assim, o “primeiro” amor é o “melhor” amor.
Podemos derivar disso também expressões como “lugar de honra”, “líder”, “ser o
primeiro” ou “assumir o lugar principal”. No tabernáculo, o lugar santo antes
do Santo dos Santos também era chamado de “primeira tenda” ou “tenda anterior”.
Ali os sacerdotes atuavam na presença direta do Senhor; não havia mais nada
entre eles. Também isso revela a vontade do Senhor: que vivamos tão diretamente
com Ele e na Sua presença, que Ele tenha o primeiro lugar em nossas vidas!
A mesma palavra
grega “protos” também é usada na parábola do filho pródigo, que voltou para o
pai totalmente empobrecido e com as roupas rasgadas. Este mandou lhe trazer a primeira, isto
é, a melhor roupa:“Trazei depressa a melhor roupa, vesti-o...”
(Lc 15.22). Não se tratava de uma roupa de festa que o filho talvez já
tivesse usado em ocasiões passadas, mas, sim, da principal roupa de festa.
O Senhor
encontrou muitas coisas boas entre os cristãos da igreja em Éfeso (cf. Ap
2.2-3), mas Ele em si não era mais o Melhor e Primeiro entre eles. Alguém
disse, com muita propriedade: “O bom é inimigo do excelente”. Mais uma vez: o
melhor – o primeiro amor a Jesus – deve vir antes de qualquer outra coisa.
Quando permitimos que algo venha antes do “primeiro amor”, então este passa a
ser o segundo ou até mesmo o terceiro amor.
O seu amor
pertence primeiro ao Senhor Jesus? Ele tem prioridade absoluta
em sua vida? Você realmente coloca todo o resto depois dEle em sua vida? Você
se esforça para prestar atenção ao que Ele diz quando procura lhe falar por
meio de Sua Palavra na Bíblia, a fim de ter comunhão verdadeira com Ele? Você
continua a amar o Senhor Jesus sobre todas as coisas quando perde tudo aquilo
que lhe é caro, quando, por algum motivo, não pode mais trabalhar ou se
movimentar? Você aprendeu a amá-lO sobre todas as coisas? Você escutou e
aplicou a tempo em sua vida a advertência de Jesus para os cristãos de Éfeso? O
Senhor descreveu o significado do verdadeiro discipulado com estas palavras
extremamente sérias:“Assim, pois, todo aquele que dentre vós não renuncia a
tudo quanto tem não pode ser meu discípulo” (Lc 14.33).
Certa vez Charles Haddon Spurgeon contou esta
emocionante história, que combina muito bem com o tema do “primeiro amor”: “Nós
amamos nossas famílias, mas em comparação a Ele podemos odiar pai, mãe, irmãos
e irmãs por amor do Seu nome. Quando certo mártir estava para ser queimado,
trouxeram-lhe sua esposa e seus onze filhos para tentar convencê-lo a renegar
sua fé. Ordenaram aos seus familiares que um a um se ajoelhassem à frente dele,
pedindo-lhe que negasse sua fé e vivesse por amor à família. Mas, beijando um
após o outro e demorando-se junto à mulher amada, ele disse: ‘Por amor de
vocês, meus queridos, gostaria de fazer algo que me permitisse continuar
vivendo com minha família; mas como se trata de Cristo, meu Senhor, preciso me
afastar de vocês”’. Norbert Lieth http://www.chamada.com.br
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